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Reflexões sobre Propriedades Textuais: Coesão, Coerência, Argumentação
Rosa Maria Pexe └1┘
A partir de meados do século passado, nos defrontamos com uma evolução epistemológica no campo da Ciência Linguística que ultrapassa os limites que até então a lingüística apontava – a frase. Os linguistas constataram que a Linguística da frase não era suficiente para resolver certos fenômenos lingüísticos de natureza mais abrangente. Havia necessidade de uma lingüística mais voltada para a organização textual e responsável pela construção do sentido. Desta forma, surgiram os primeiros estudos sobre as relações transfrásticas e sobre os processos e mecanismos de organização textual que inseriram textos em seus contextos sociais, culturais e ideológicos.
Essa nova concepção fez surgir uma nova unidade de análise que vai além dos limites da frase: O texto, e com base em uma nova concepção de linguagem.
“ ... a linguagem como forma ou processo de interação. Nessa concepção o que o indivíduo faz ao usar a língua não é tão-somente, traduzir e exteriorizar um pensamento, ou transmitir informações a outrem, mas sim realizar ações, agir, atuar sobre o interlocutor (ouvinte/leitor). A linguagem é pois um lugar de interação humana, de interação comunicativa pela produção de efeitos de sentido entre interlocutores, em dada situação de comunicação e em um contexto sócio-histórico e ideológico. Os usuários da língua ou interlocutores interagem enquanto sujeitos que ocupam lugares sociais e “falam” e “ouvem” desses lugares de acordo com formações imaginárias (imagens) que a sociedade estabeleceu para tais lugares sociais.” (KOCH @TRAVAGLIA-1993:23)

Desta forma, a linguagem passa a ser considerada uma forma de ação e interação entre as pessoas, ou seja, passa a ser um processo sociocomunicativo e dotado de tencionalidade. Essa concepção como processo em permanente construção é apresentado por BAKHTIN (1995:123) que diz:

“A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas lingüísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua.”

No Brasil esses estudos sobre a Linguística Textual chegaram somente nos anos de 1980, com o objetivo de estudo e pesquisa sobre a natureza do texto visto como sequências lingüísticas coerentes e os fatores que envolvem sua elaboração, produção e recepção.
A Linguística Textual passa então a se preocupar com os princípios de constituição de um texto, fatores de coerência, condições em que se manifesta essa textualidade, a pontuação de critérios para a delimitação do texto e a diferenciação dos vários tipos e gêneros textuais.
Segundo KOCH & TRAVAGLIA, ( 1993) os critérios básicos de textualidade, isto é, aquilo que faz com que uma sequência linguística seja um texto, é a Coerência, responsável por estabelecer sentido, através de vários fatores como conhecimentos lingüísticos (incluindo mecanismos de coesão), conhecimentos prévios, conhecimentos partilhados, inferências, fatores de contextualização, situacionalidade, informatividade, intencionalidade, aceitabilidade, focalização, intertextualidade, relevância e consistência. Sendo Assim, a Coesão e a Coerência são propriedades textuais essenciais para a expressão e compreensão da mensagem a ser transmitida por um texto.
Fávero (1995) define coerência como resultado de processos cognitivos operantes entre os usuários, ou seja, a falta de coerência afeta a compreensão da mensagem em seu nível macrotextual. Já falta de coesão, limita-se ao nível microtextual,ou seja, a coesão refere-se ao modo como as palavras e a orações se ligam entre si, formando as sequências e os parágrafos.
A Coerência, é fator fundamental da textualidade para estabelecimento do sentido, vai além da sequência linguística. É um fenômeno externo, pois depende também da situação comunicativa que contextualiza o texto. Envolve aspectos lógicos, semânticos e cognitivos por depender do conhecimento partilhado entre os interlocutores. Enfim, a coerência textual pode ser considerada a possibilidade de atribuir continuidade de sentidos, a um texto. Esses sentidos podem compor um mundo imaginário, ficcional. O importante é que, pela coerência, um texto faz sentido para seus leitores e ouvintes.
A COESÃO tem a ver com a maneira como o texto é redigido, ou seja, a superfície textual,é a organização, a ligação entre os elementos da superfície do texto, a correlação entre as partes de uma frase ou as frases entre si.
“ A coesão seqüencial também se faz através de dois procedimentos: a recorrência e progressão . A sequenciação por recorrência ou (parafrástica) é obtida pelos seguintes mecanismos: recorrência de termos. de estruturas (o chamado paralelismo), de conteúdos semânticos (paráfrase), de recursos fonológicos segmentais e suprassegmentais (ritmo, rima, aliteração, eco, etc.) de aspectos e tempos verbais.” (KOCH @ TRAVAGLIA-1993-45)
Logo, coesão seqüencial diz respeito aos procedimentos lingüísticos que, além de interligar as partes do enunciado, fazem o texto progredir no desenvolvimento do tema em direção ao objetivo pretendido.
A coesão por ser também referencial, isto é, um processo linguístico que remete a interpretação de um elemento expresso no texto a outro que já foi utilizado para construir esse texto. Diz-se que um item faz referência a outro quando não pode ser interpretado por si mesmo, mas em relação a esse outro; quando a significação de um está associada a significação do outro. A retomada das referências, por meio da coesão referencial, orienta o leitor no processo da leitura. Por isso, o cuidado com o emprego de palavras e expressões com valor coesivo é relevante na construção de um texto objetivo e claro.
Os recursos de coesão visam, antes de qualquer outra análise ou classificação, dar instruções a respeito de como deve ser interpretada a sequência de ideias em um texto, de modo a criar um mundo textual coerente. Sendo assim, os mecanismos de coesão não se desvinculam da construção da coerência, nem da situação sociocomunicativa de onde emerge o texto. Marcas desnecessárias em uma situação podem ser imprescindíveis em outra.
A Argumentação

Os símbolos são elementos mediadores entre o relacionamento do homem tanto com a natureza quanto com os seus semelhantes, ou seja, as relações homem-natureza e homem-homem se estruturam simbolicamente. O relacionamento, entre o homem e a linguagem como elemento de representação do mundo é tratado à luz da Semântica, e a interação social do homem na e através da linguagem constituí-se objeto de estudo da Pragmática.
A interação social por intermédio da língua caracteriza-se, fundamentalmente, pela argumentatividade. O homem, ser dotado de razão e vontade, constantemente avalia, critica, isto é, forma juízos de valor. E por meio do discurso, toda ação verbal emitida é carregada de intencionalidade, ou seja, o falante tenta influenciar sobre o comportamento do(s) ouvinte(s) ou leitor(es) ou fazer com que ele compartilhe de suas opiniões. Todo e qualquer enunciado traz implícita ou explicitamente uma ideologia, mesmo quando há intenção de imprimir neutralidade as palavras.
Ao aceitar que, “Todo e qualquer discurso subjaz uma ideologia” (KOCK, 1993-19) joga por terra também a diferenciação ou distinção tradicional, que estamos acostumados a vir nos manuais didáticos, entre os termos dissertação e argumentação, a primeira teria de limitar-se apenas, à exposição de idéias alheias, sem posicionamento pessoal do falante ou escritor. Porém a seleção das opiniões de outrem já implica em uma opção, ou um posicionamento. A argumentatividade também se faz presente nos textos narrativos e descritivos.
Alguns filósofos analíticos de Oxford, como (austin, Searle, nos EUA) dedicaram-se aos estudos dos atos da linguagem, ou seja, aquilo que se faz quando se fala e postularam a existência de atos ilocucionários, que encerram a “força” com que os enunciados são produzidos, e de atos perlocucionários, que dizem respeito aos efeitos visados pelo uso da linguagem, entre os quais os de convencer e de persuadir.
A argumentação tomou novo impulso com os trabalhos de Perelmam, que tenta aliar os principais elementos da Retórica de Aristóteles a uma visão atualizada do assunto e empenha-se na elaboração de uma “Nova Retórica”. Assim, o discurso tornou-se objeto central de diversas tendências da lingüística moderna, como a Análise do Discurso, a Teoria do Texto e a Semântica Argumentativa, preocupada com a construção de uma macrossintaxe do discurso, a qual defende uma pragmática integrada à descrição lingüística, isto é, como um nível intermediário entre o sintático e o semântico.
Para Angelim, 2000, há duas formas de se chegar ao interlocutor: pela sedução que seria o apelo imediato e pela estruturação de um texto, com encadeamentos lógicos, ou seja, fazendo uso da argumentação que é a exposição de motivos em sequenciação lógica que visa o conhecimento, logo a argumentação resume-se em texto estruturado com encadeamentos lógicos. (fazem parte desses encadeamentos lógicos a argumentação, coesão e a coerência)

B I B L I O G R A F I A

ANGELIM, Regina C.C.O Modo Argumentativo de Organização do Discurso.RJ.UFRJ.2000.

BAKHTIN, M. Marxixmo e filosofia da linguagem.S.Paulo: Hucitec, 1995.

____________ Os Gêneros do discurso IN: Estética da Criação Verbal.S.Paulo: Martins Fontes, 1997.

___________ O problema do texto in: Estética da Criação verbal.S.Paulo: Martins Fontes, 1997.


FAVERO, L. L. . Coesão e Coerência Textuais. 3. ed. São Paulo: Ática, 1995.


KOCH, Ingedore Villaça. Argumentação e Linguagem. S.Paulo: Contexto, 1993.

___________________ O texto e a Construção dos Santidos.S.Paulo.Contexto.1998.

__________________, TRAVAGLIA, Luís Carlos. A coerência textual.S.Paulo.Contexto,1993.

PERELMAN,C., OLBRECHTS-TYTECA, L.Tratado de argumentação: a nova retórica.S.Paulo.Martins Fontes,1996.